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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Lusconfuso

greensleeves was my delight, greensleeves was my heart of gold, greensleeves was my heart of joy...



alas, my love...

eu assoprava a melodia constantemente na flauta, numa só intensidade, em transe.



só chove e num passa, olha só, são só 7 horas, é cedo, é cedo.

mais um café, bem quente.



café era tudo que tinha pra tomar, sem açucar, sem pão nem manteiga, nem nada.

minha barriga implorava por uma sopa, e a criança com sono perdida na minha infância também.



deitei no chão, carpete... um dia eu havia chegado cansada, de viagem, e encontrado essa casa... cheirei madeira no armário, ramos no cipreste, lambi a pedra talhada, deitei no chão no carpete verde parecia madeira...

botei um céu de estrelas no meu teto, em volta do lustre de vidro, e uma cortina com cara de antiga, pro meu quarto de floresta...

dormi.



acordei às 7 horas da noite, fim de tarde, luz confusa luscofusco como diria meu pai



na estrada, essa é a pior hora pra viajar

na floresta, essa é a melhor



no quarto, é a hora da solidão.



café quente vento frio café quente vento frio logo era hora de sair... vazio



então eu vivia pra academia, sem um tostão furado no bolso, vivendo de pesquisar... minha última idéia tinha começado a dar resultado, e tinha até recebido uma correspondência de um pesquisador famoso, me convidando pra uma expedição... e eu estava juntando recursos pra chegar lá.

vou levar a flauta, e repelente, e... o cenário ao redor da possível escavação viagem da expedição me absorve o verde intenso o ocre quente as montanhas longes o silêncio vivo

suspiros e suspiros

vesti uma calça rasgada, camiseta surrada o tenis vermelho e fui dar uma volta entre as mariposas e a praça (elas dormem em algumas àrvores, e eu tenho que andar sem acordá-las todas)

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Formigas

As formigas brotavam debaixo das telhas que recobriam o muro velho - muro do vizinho. Velho, embolorado e porcamente pintado de branco. As formigas proviam de uma casa ao lado como a inveja que se arrastava qual neblina fedorenta por toda a superfície do asfalto que corria na rua.

Foi logo depois de uma semana da mudança que tudo começou. Depois de estar tudo razoavelmente encaixado e devidamente alocado, num dia nublado de verão que elas se mostraram. A moça estendia as roupas no varal, torcendo pra que estivessem secas antes que a chuva desabasse no fim da tarde como parecia, e do nada ela olhou pra parede do muro.
Um filete escuro descia, era água suja residual que ainda escorria das telhas? - Chegou mais perto, aqueles insetos de fogo sem asas fervilhavam na ordem que lhes é habitual.
-- Iiii, dizem que quando começa dar formigas na casa é porque as pessoas não vão parar ali. Será que a gente nunca vai ter paz num lugar? - a voz da dona da casa falou da janela da cozinha.
-- Não sei, não sei, é que a casa do vizinho é velha e mal cuidada.

Uma semana depois ela pegou o chocolate alemão escondido no guarda roupas e quando deu a primeira mordida no bloquinho tirado com todo cuidado - como fazer um chocolate bom durar mais - o gosto ardido incômodo pinicou a lateral da língua.
"Mas não tinham formigas antes aqui no quarto, muito menos no guarda-roupa, perfumado e limpo. Mesmo quando escondia doces no guarda-roupas, nunca elas invadiram assim meu espaço."
Tirou tudo do armário e elas estavam escondidas atrás do vidro de perfume antigo que a moça guardava como artigo de colecionador.

Outro dia era dentro das partituras, entre as teclas do piano, debaixo dos golfinhos esculpidos em pedra-sabão.

Formigas
d ....................................................................... a parede
e ....................................................................... do lado d
s ....................................................................... o espelh
c ....................................................................... o no ban
e ....................................................................... heiro sai
n ....................................................................... ndo do n
d ....................................................................... ada des
o ...................................................................... a p a r e c e n d o ... . .
...................................................................... por um buraco do acabamento de gesso decorado

-- Você acha que a gente vai continuar por muito tempo nessa casa?
-- A - cho que não, não. Tem muita formiga. Tem formiga até dentro do armário.
...
Sei que eu não fico por aqui.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Peneira de sonhos

Tem tanta coisa que fica perto do ar, no limiar. Na linha de luz que fica entre o céu e o mar, lá longe no horizonte. (O horizonte lembra a borda de um prato de sopa.)

Tem tanto sonho que fica pra trás. Daí aparece um vendaval e uma peneira de areia grossa e os sonhos podem ser pinçados e catados de volta, de volta pra nossa bolsa a tiracolo.

Levo meus sonhos a tira colo. E sempre estando certa que não tem nenhum rasguinho no fundo da bolsa.

Sempre tem aqueles sonhos rebeldes que pulam pra fora, voam, querem brilhar fora da minha bolsa surrada.

Mas sempre tem o vento e a peneira.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Flores da saudade

Começou aquela manhã. Uma promoção incrível no supermercado: sabonete preferido pela metade do preço! Precisava. Comprei um só, se tivesse levado mais dinheiro comprava mais. Escolhi uma fragrância não habitual: "Flores da Primavera".
Já de noite - era domingo, cheio cansativo e modorrento - a água escorria mesclada a espuma do sabonete. A saudade veio com o perfume.

Saudade... tentei lembrar da saudade...

A roupa esperando sobre a cama, o copo de nutella pela metade de dry martini, o banheiro da república, do apartamento, da outra república, da casa onde eu tomava banho novamente.

Um tempo só meu aquele tempo - expectativa e bolo de chocolate com cereja, dry martini com cereja, correr os corredores da cidade nas noites quase mornas da primavera.

"For winter's rains and ruins are over;
....... And all the season of snows and sins;
The days dividing lover and lover,
....... The light that loses, the night that wins;
And time remembered is grief forgotten,
And frosts are slain and flowers begotten,
And in green underwood and cover
...... Blossom by blossom the spring begins."


Inalei fundo a fragrância que desprendia do sabonete - o cheiro residual do álcool utilizado no processo de fabricação me lembrou as faxinas de terça-feira.

Aquele banho estava era rendendo para a companhia paulista de força e luz.




segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Barriga cheia.

Não foi a primeira vez.
De manhã, aquela sensação de quem tinha dormido demais e perdido o trem e alguma carona da vida. Teria então que esperar a próxima rodada.
Fazia tempo que não jogava jogos de tabuleiro, não gostava de jogos. No jogo, sempre alguém perde. Não que não gostasse de perder, mas achava que não deveriam haver perdas. Todo um universo meio infantil.
Levantou-se, comeu, se achou cheia do mundo todo como se tivesse cometido o maior dos excessos de gulodice, mas era só um copo de água com um pedaço de pão integral meio seco - mesmo assim.
Era dia de começar, limpar a casa, lavar as roupas, arrumar o quarto e botar as tarefas em dia. Tantas coisas a serem feitas no meio desses itens tão simples.

Aquela casa de hotel às vezes era desconfortável demais.